Especialistas da área de hematologia se reuniram em uma mesa redonda apresentada pelo Dr. Thales Gouveia Limeira, para falar sobre o papel do laboratório clínico na hematologia. Estiveram presentes os hematologistas Dr. Alex Freire Sandes, Dr. Rodolfo Cançado, a Dra. Audrey Zeinad e o Professor da Universidade de Medicina do ABC, Fernando Luiz Affonso Fonseca.
A primeira apresentação da mesa redonda abordou as tendências em microscopia digital. O médico hematologista, Dr. Alex Freire Sandes, traçou um paralelo entre diferentes modelos disponíveis no mercado e as suas aplicabilidades, além de mostrar soluções que ainda estão em desenvolvimento.
O Dr. Sandes descreveu brevemente a história da automação em hematologia, iniciada no ano 2000, mas foi a partir de 2013 que as soluções se expandiram aos laboratórios. As marcas citadas foram: Cellavision, a israelense SCOPIO 100 e Mindray MC-80.
De acordo com o médico, a microscopia digital tem diversas aplicabilidades, e ele exemplificou com a análise de campo completo e medula óssea. No caso do SCOPIO 100 para medula óssea, o mercado nacional ainda aguarda a aprovação da Anvisa. Já a Cellavision, iniciou a validação da metodologia.
Apesar de ser uma solução extremamente fiel às imagens geradas, capaz de mostrar quais células estão intactas e quais não estão, o cenário nacional apresenta baixa adesão à tecnologia. De acordo com o hematologista, em um universo de 24.500 laboratórios clínicos, há cerca de 63 microscópios digitais, com prevalência nas regiões sudeste e sul.
Entre as explicações, estariam o custo elevado dos equipamentos, mas, uma análise de viabilidade já justificaria o investimento, de acordo com o especialista; a exigência de treinamento de mão-de-obra; desconhecimento sobre os benefícios da tecnologia; entre outros.
A evolução dos marcadores de anemia ferropriva
O médico Rodolfo Cançado foi o segundo hematologista a se apresentar na mesa redonda, falando sobre os marcadores laboratoriais de anemia ferropriva. Inicialmente, o Dr. Cançado reforçou a importância do ferro de forma geral para a saúde e suas dezenas de funções metabólicas. “Hoje se tem um olhar cuidadoso para a importância do ferro em organismos sem anemia”, ressaltou.
Como fazer e analisar o diagnóstico inicial da anemia e tornar a questão menos negligenciada? O Dr. Cançado comentou que a deficiência de ferro e a anemia são subvalorizadas e respondeu à questão pontuando que é preciso fazer um diagnóstico investigando o histórico do paciente, isso serve de orientação para a tomada de decisão.
Seguiu abordando os métodos para diagnóstico de deficiência de ferro, incluindo o apoio do documento da World Health Organization de 2020, sobre os níveis de ferritina na avaliação do estado do ferro. O médico chamou a atenção para uma questão em particular: “No diagnóstico de deficiência de ferro, um exame de ferro sérico não apoia a avaliação inicial da anemia”.
O hematologista exibiu brevemente os estágios de deficiência de ferro, que podem acompanhar ou não uma anemia, e citou os indicadores de diagnóstico da deficiência de ferro: hemograma + citomorfologia, reticulócitos, ferro sérico, capacidade total de ligação de ferro, ferritina, proteína C reativa.
Em continuação, Dr. Rodolfo Cançado citou os novos biomarcadores para diagnosticar a deficiência de ferro: eritocitários, reticulocitários e séricos. O destaque, de acordo com ele, são os biomarcadores reticulocitários e suas possibilidades de aplicações clínicas. A contagem de reticulócitos oferece rapidez, maior precisão e menor subjetividade e mostra um maior número de células analisadas.
O especialista enfatizou que o mais recomendado é “o hematologista conhecer a clínica e se conectar com o patologista para uma ajuda mútua e que sejam solicitados os exames que realmente interessam”. Para ele, essa é a melhor forma dos laboratórios estarem alinhados à clínica do paciente: “Isso não faz o diagnóstico, mas direciona o melhor tratamento”.
A saúde do sangue pós-covid
Em sua apresentação na mesa redonda, o Dr. Fernando Luiz Affonso Fonseca, da Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), voltou alguns anos no tempo para mostrar o cenário mundial no início da covid-19.
Nesta retrospectiva, citou as características do vírus e a sua atuação no corpo humano, com foco no tromboembolismo e coagulopatias na covid-19, além do comprometimento da qualidade de vida após a fase aguda.
Especialista do laboratório de análises clínicas da Faculdade, onde foi identificada a variante ômicron pela primeira vez, o Dr. Fonseca determinou os biomarcadores como fortes aliados na detecção de problemas trombolíticos em pacientes com a doença. O especialista apontou estudos que mostraram o surgimento de trombofilia hereditária pós-covid e outras novas doenças, especialmente cardiovasculares.
Alguns dados apresentados:
- 20,5% é a incidência de trombose venosa profunda e 11,4% de embolia pulmonar em pacientes com SARS.
- 14% dos pacientes na admissão inicial preenchiam os critérios de diagnóstico do DIC. Com a progressão da doença, o número aumenta para 57,2%.
- 31% é o índice de complicações trombóticas em pacientes internados em UTI.
Para visualizar melhor o cenário de forma geral, o Dr. Fernando Fonseca, chamou a atenção para a importância da caracterização de pós-covid, “ainda falta uma melhor definição na literatura”. Acrescentou também o desafio de associar os marcadores e/ou exames laboratoriais estudados na fase aguda e correlacioná-los com o pós-covid. Além disso, é preciso se atentar ao pós com vacina e sem vacina.
A evolução da tromboelastografia (TEG)
A médica hematologista Audrey Zeinad do Hospital Sírio Libanês abriu a sua apresentação contando um histórico sobre a tromboelastografia e explicou que é um método dinâmico de avaliação sanguínea.
Também chamado de tromboelastograma, o exame faz parte de um grupo de ensaios tradicionais, juntamente com o ROTEM. Entretanto, em um comparativo entre os dois métodos, a Dra Zeinad explicou que o TEG é ideal para emergência, para uso em ‘real-time’ “É um teste importante para rápidas tomadas de decisões, como em casos de um transplante hepático”.
A especialista acrescentou que o TEG pode ser utilizado em muitas situações clínicas, assim como para o manejo de doenças hemorrágicas, sangramento intraoperatório, etc. Mas ainda há a necessidade de estudos adicionais para confirmação de sua eficácia e reprodutibilidade e um aprimoramento dos dispositivos atuais.